quinta-feira, 22 de julho de 2010

Conselho de Satã: Não aposte com o Chefe (Ele sempre vence no livro Dele).

Não aposte com o Chefe.

O Chefe: Tá vindo de onde?
Satanás: De bobeira por aí, de rolé aí na pista.
O Chefe: Se ligou no meu pela, o Jó? Ele é o cara, firmeza. Sujeito correto.
Satanás: Nada nessa vida é de graça chefia. Tu não protege o cara e as paradas dele e não encheu ele de grana? Ranca dele as parada pra tu vê se não te esculacha na cara.
O Chefe: Já é, rebenta as parada dele, mas não fode com ele não.

E, ouvindo isso, Satanás se adiantou.

Um tempo depois, na casa de Jó:

Escravo:Patrão, lombrou. Passou um arrastão e levou tuas vacas e passou o cerol em geral. Só sobrei eu, que saí fora pra te falar qual foi da parada.

E, como desgraça pouca é bobagem...

Escravo2:Caralho patrão, que viage doida, caiu FOGO DO CÉU E FUDEU PRAS OVELHAS E PROS OUTROS ESCRAVOS. Só sobrei eu pra te dar o papo!

E, como Satanás joga a vera...

Escravo3 (interrompendo Escravo2:): Três bonde boladão passaram aqui na nossa área e levaram os camelos e passaram geral na faca chefia, só eu que consegui me adiantar pra te dar a boa.

E...putz tá igual zorra total essa merda.

Escravo4 (interrompendo Escravo3): Aí patrão a casa caiu. Caiu mermo. Em cima dos teus muleque, bem na hora da balada. Um furacão dirrubou o barraco, eu escapuli sozinho e vim te mandar essa.

Jó surtou. Rancou as roupa do corpo, raspou a cabeça, e caiu no chão gritando: Nasci peladão da barriga da minha mãe, vou voltar peladão tamém (N.E. Fudeu, vai matar a mulé). O Chefe dá, o Chefe tira, é isso aí. Bendito Chefe!

Em nada disso havia Jó falado merda ou esculachado seu Chefe.

O Chefe: Tá vindo de onde?
Satanás: De bobeira por aí, de rolé aí na pista.
O Chefe: Se ligou no meu pela, o Jó? Ele é o cara, firmeza. Sujeito correto.
Satanás: Nada nessa vida é de graça chefia. Tu não protege o cara e as paradas dele e não encheu a burra do hômi de grana? Ranca dele as parada pra tu vê se não te esculacha na cara.
O Chefe: Já é, esculacha as parada dele, mas não fode com ele não.
E, ouvindo isso, Satanás se adiantou.Continua...

Pausa Poética: Todo emo é homo.

Até a sua mãe tem vergonha de te ver
de calça apertadinha, gel , laquê
você pintou as unhas, o que ela pode fazer?
sua vó e sua tia tem pena de você

Você não é incompreendido
é apenas um fudido
e já é hora de saber
você é mesmo um merda
eu concordo com você

Pegue essa gilete e seja macho quero ver
um corte de respeito pra todo mundo saber
o quanto você é triste e sua vida é uma merda
que o seu pai te bate e sua mãe não presta

Chame todos seus amigos
pra no shopping passear
rebole essa bundinha
até a aids te matar

Feitiço para afastar Polícia Federal , Bicheiro , Fura-Olhos (ninjas ou não) e Traíras (pessoas, não peixes):

Olanzapin Alprazolam
Que durma o bicheiro
até amanhã(m)
Alprazolam Olanzapin
Mande a polícia
pra longe de mim
Afastai fura-olho
Afastai X-9
Eu planto o que colho
na horta que chove.
Dedicado ao feiticeiro J.L.

Ode às Vagabundas (Conselho de Avó)

Não me lembro como foi,
se na espuma ou na fumaça,
que esqueci, fazendo graça,
pra quem aconselhei:

Meu filho, Amai as Vagabundas.

A Virtude do conselho,
Que Herdei da minha Avó,
É para aquele que de Si,
não exige nenhum Dó
como tenho em barbas minhas
os vários Gostos das Putinhas,
companheiras da Mocidade
Sem Culpa e sem Piedade,
Digo:

Meu filho, Amai as vagabundas.

Curiosas e Sabidas,
Brincalhonas e Sorridentes,
sacaninhas entrementes,
E On Top altivas.

Não Ama as Vagabundas?
Como é que pode ser?

Experimente então você,
Mãos dadas no sofá,
Até tarde com a tevê:

-Tire a mão daí!
-Papai pode chegar!
-Eu mal te conheço!
-Pra comer tem que casar!


Pra que moça direita
sarrando sem fuder,
Que te ama e te respeita,
trepando sem gemer?

Anamnese

Anamnese

-Estou ficando louco, doutor. Ou já estou. Eu preciso de ajuda. Rápido.

Muito bem meu rapaz, mas, me diga, o que está acontecendo?

-Tenho ouvido vozes. Na minha mente. Freqüentemente.

Vozes? Que tipo de vozes? Fale-me sobre elas.

-Na minha mente. De um homem morto...vivo... um ... fantasma. Ele diz se chamar "G-Zuiz".

Hum. Fale-me mais sobre essa coisa de... "G-Zuiz", como começou?

-Bom, no início foi bem sutil. Eu comecei a sentir uma presença por todos os lugares. Como se alguém estivesse sempre comigo. E eu sei que é ele, me observando.

Entendo. Então, é como se ele estivesse em todo lugar?

-É.

Vigiando você?

-O tempo todo.

Mas qual seria seu objetivo?

-Ver se estou agindo correto.

Certo. Ele lhe regra a conduta. Como uma figura paterna. Certo?

-É... algo assim,não sei bem... é como um... pai... celestial.

Como assim, um extraterrestre?

-Não é bem isso, ele é, assim, tipo, cósmico, mas foi um homem, só que morreu. Há muito tempo atrás.

Então um fantasma espacial está avaliando seu comportamento. Mas por qual razão?

- Ele quer que eu seja bom, e eu acho que quero também.

Você se considera uma pessoa ruim?

-Não, quer dizer... já fumei maconha, mas nunca traguei.

Nem você nem o presidente.

- É, ele é um homem muito bom.

Fumar maconha não me parece tão digno da preocupação de um fantasma espacial. Haveria algo mais?

-Hum, eu também joguei no bicho.

Hum. Ganhou alguma vez?

-Não.

Nunca? Nem um real?

-Não.

Sério?

-Nunca. Pra não incentivar os outros. Às vezes eu ouço muito a minha consciência, entende? Mas às vezes eu ajo sozinho. Como um carro, sem
motorista. E às vezes eu gosto assim. Meu pai dizia: Ladrão só, puta só. Porque malandro duro é cagüete. Agora tenho ouvido mais a G-Zuiz e tenho feito o que ele me diz.

E o que lhe diz para fazer, esse "G-Zuiz"?

-Ele quer que eu o ame e o aceite sua palavra em meu coração. E quer que eu ame todas as pessoas da Terra.

Hum. Então, por meio dessas faculdades telepáticas que usam para se comunicar, você deve lhe jurar obediência e praticar necrofilia e o amor livre?
-Não. Sem sexo. Ele próprio nunca fez.

Hum, ele revela intimidades a você. Algo mais?

-Devo também comer de sua carne e beber o seu sangue. Em um templo, durante um ritual mágico.

E qual o objetivo desse rito canibal?
-Assim me conecto com ele e sou liberto do Pecado.

Como pode esse "G-Zuiz" ser um fantasma e possuir carne e sangue? Ele aparece pra você? Fisicamente, ou de outra forma?
-Não. Pão e Vinho comuns são transformados por ele através de um feiticeiro, e assim se tornam sua carne e seu sangue. Eu não entendo muito
bem. Eu ainda não fui. Tive medo.

E esse feiticeiro, ele também se comunica com o fantasma?
-Acho que sim. Na verdade, G-Zuiz persegue todas as pessoas e lê seus pensamentos.

Ninguém está livre?
-Não. Não há escapatória. Ele conhece seus Pecados.

Pecados?

-Coisas que ele não quer que você faça. Erradas.

E se você fizer?
-Aí eu vou pro inferno, onde parece ser uma merda. Ele que falou.

E você não quer ir pro "inferno"?
-Não. Pareceu muito ruim, estou assustado.
Certo. Então você obedecer seu "pai cósmico" para não ser castigado?
-Eu não sei, nem sabia que tinha inferno antes. Mas não pareceu bom quando ele falou.

Entendo. E você já fez muitos... Pecados?

-Não sei bem. Acho que não muitos, quase só os que lhe disse, mas eu já nasci com um, bem pior.

Como assim?
-Então, minha antepassada distante dividiu uma fruta de Pecado com o marido depois do pai de G-Zuiz ter proibido comer fruta da Árvore Mágica.

E porque ela comeu?
-Foi uma cobra que mandou. Era normal onde eles moravam, parece. Cobra falar, quero dizer. Ou todos os bichos. Acho que eram todos.

E aí você herdou o Pecado? Pelo sangue?
-Pois é. Ou pela "alma". Foi o que disse G-Zuiz.

"Alma"?

-É tipo você, mas sem as coisas.

Nunca ouvi falar

-Nem eu, mas parece importante, e está cheia de Pecado.

Porque seus antepassados comeram uma fruta?
-É. Uma Fruta Mágica.

E o que aconteceu com eles?
-Foram expulsos das terras do pai de G-Zuiz e tiveram que trabalhar pra se sustentar. Acho que viraram lavradores.

Você tem casa própria?
-Apartamento.

Você... não gosta de trabalhar?
-Hum...gosto...como todo mundo, acho.

Estranho.

Garoto Supimpa (Pensando positivo II)

Na minha escola tinha um rapaz super supimpa
Ele andava de moto e
Tinha amigos mega legais
O rapaz vivia sorrindo, um sorriso maroto
era supimpa mesmo
Saí com ele e experimentei muitas coisas diferentes
foi uma noite muito longa, mas não dá pra lembrar muito
Quando meu pai soube que eu estava grávida
ele me disse coisas muito duras
Mas eu agüentei firme, até ele me acertar com a cadeira
quando acordei na cama do hospital
Tinha perdido o bebê
Garoto Supimpa disse "Graças a Deus"e beijou meu pai"
Graças a Deus", repetiu meu pai.
"Graças a Deus", imitei também.

Querido diário,

Meados de 2005 ,foi quando Jesus me cagou na cabeça. Ele tem Sua própria maneira de operar em nossas vidas. Escreve certo por linhas tortas. Muito habilidoso. Quanto a mim, nunca fui bom em caligrafia e escrevo torto por linhas certas, porque tenho preguiça e gosto de me sentir especial. Como Ele. Ou o Outro. Ou um cara da Apae. Sem me desviar demais, quero dizer que Jesus me conseguiu um emprego (ruim), uma namorada (...) e um surto psicótico (não muito ameno), tudo quase de uma só vez. Mágico. Não sei como Lhe agradecer. Dirigir-me-ei então, ao próprio:

Espero que, diante de Sua Infinita compreensão, não me tome por mal-agradecido. Mas a namorada não era tão boa assim. Ela era magrela e branquela, de óculos e flácida, lia livros demais e tinha muitas teorias. E, no fim , ela me levou a trabalhar. Como Eva, antes dela, levou Adão a trabalhar, na história que envolve uma cobra falante e uma fruta. Um caso clássico. Não pude evitar. Eu precisava trabalhar para ficarmos juntos - sabia que seria pra sempre, sentia que ela era para mim. Sabia que ela era pra mim porque a mão do palhaço nos uniu num buteco fim de carreira, quando minhas carreiras estavam no fim, numa encruza, num cú de cidade. Sabia que ela era pra mim porque ela namorava meu amigo. Eu tinha essa coisa com mulher dos outros. E mulher dos outros tem essa coisa comigo. O Seu Pai quis assim, Seu Pai nos fez assim, Seu Pai armou o circo auspicioso daquela noite. Enquanto minha futura namorada malabareava o chifrar de seu semi-namorado atual (talvez eu não estivesse furando o olho de ninguém - ela me disse e eu quase acreditei), outro amigo planejava chifrar a sua com uma dessas barangas charmosas e inteligentes que justificam a piranhagem filosoficamente. Não é pra qualquer uma, você pode pensar, todo esse ilusionismo, mas as universidades do Rio estão cheias delas. Elas tem em suas almas uma desenvoltura desavergonhada pra culpar o corno pelo chifre. Ou a corna. Colou com meu amigo. Mágica. Ou talvez ele só estivesse a fim de fuder. Bom, fim de noite, casa da baranga sexy. A sacanagem rolando, e eu com ela, até onde o álcool, a cocaína e a maconha me permitiram ir -algumas linguadas, nem tantas, mas estratégicas, e foi isso. Em algum lugar da noite perdeu-se um poema do Vinícius. O Vinícius era pegador - eu não - ao raiar do Sol, apaixonei. Seu filho da puta. Perdão, esqueci que era o Senhor.

Levou algum tempo até que as coisas se arrastassem no lodo de briguinhas e tédio que é o desenlace do êxtase (o sentimento - a droga é 'ecstasy' - também globalizada, também dá revertério) . Antes disso, a tristeza consumiu meu amigo abandonado, ele cansou de consolar-se comigo (ninguém disse nada a ele) e mudou-se pra junto da família, onde começou a fabricar guitarras. Foi bom pra ele. Hoje ele estuda pedras. Tenho certeza que o Senhor planejava tudo isso, e por isso sou grato. De coração. Porém, gostaria de fazer saber ao Senhor, veja só, que não gosto de trabalhar. Nunca gostei, sem nem ter experimentado. Quando queria convencer alguém a usar drogas eu dizia: "Você nunca experimentou pra ver se é bom". Um argumento fácil. Fácil e fraco. Não venha com essa pra cima de mim. Trabalhar é uma droga, mas não como LSD. Trabalhar é como dar a bunda. Se você, cabra macho, sujeito hômi, quis experimentar pra saber, azar o seu. Você foi fudido. Literalmente , sobretudo. Estará lá no teste da farinha, a marca indelével . Ou a falta dela. Pra ficar claro, quero que você entenda que haverá uma prega faltando - como o brilho no olhar que só um vagabundo pode ter, este que se desfaz no fim da labuta, que se desfaz no ônibus lotado, que se desfaz com o som do despertador. Da mesma forma, trabalhar deixou marcas profundas em minha pessoa. Nunca mais encarei os bancos da mesma forma e os bancos não me encaravam da mesma maneira. Assim, fez-se o crédito em minha vida. E vi que crédito era bom. E sendo bom, usufruí. E usufruindo me arrasei. Não me diga que não é coisa Sua. Eu sei que Você é judeu, e vocês fecham entre si. O trabalho e o crédito são Sua forma especial de vingança, eles se atrelam um ao outro, numa simbiose mediada pelas Casas Bahia. E pensar que isso tudo porque um antepassado de discernimento duvidoso resolveu obedecer à mulher (veja só), justo quando ela começou a ouvir conselhos de uma cobra falante. E que falava de árvores mágicas e suas Frutas do Mal. Li o livro, Você sabe, e não quero me repetir (muito).

Creio não precisar lembrar ao Senhor, sendo quem És, que o meu trabalho não era especialmente ruim. Ele não era especialmente coisa alguma. Envolvia despachar coisas e carregar caixas. Mas gostar dele seria especial. Especialmente pobre da minha parte, no sentido espiritual e financeiro da palavra. Quem quer trabalhar por aquela miséria? Eu me lembro dos meus companheiros repetindo: "Eu gosto de trabalhar!", ou "Ficar em casa fazendo o quê?" e pensava: Porque não foder? Eles eram todos casados. Eu tinha uma namorada e passava a maior parte do meu tempo livre trepando com ela. É saudável. É grátis. Suburbanos e cristãos casam pra isso. Talvez suas esposas tivessem embarangado, acontece muito. Ou poderia sugerir a eles a televisão, ela muda tudo. Ou que batessem uma bronha. Usassem drogas. Caguei. Fizessem qualquer coisa ou nada, nunca acreditei no que diziam - na verdade, quando começamos a nos conhecer melhor, percebi que por trás disso havia um certo desespero. Não havia a opção de não trabalhar em suas vidas, donde, gostar de trabalhar era uma virtude. Uma lógica duvidosa, algo como: "Não posso deixar de cagar (sem morrer) então deve ser bom". Freud chamaria um cara desses de viado, e eu também. Por outro lado, Freud era judeu como o Senhor, e assim, rico. Não notaria uma diferença fundamental: Todos podemos cagar. Na real, graças ao Activia, até quem come comida saudável pode cagar. Já serviço é difícil, pra semi-analfabetos sem qualificação formal como quase todos dentre nós. E veja, graças ao trabalho tínhamos o que largar pelo cú, alimentar a privada. Mas era uma hipocrisia divertida, dizer que gosta de trabalhar e depois se imaginar ganhando no bicho e vivendo coçando o saco. Pausa:

Falar disso desperta
um poeta em mim
sinto uma vontade
de cantar assim:
"Continue trabalhando,
não pare de jogar,
reze de vez em quando
e acerte no milhar".

Sambinha também é bom quando se está de bobeira. Aqui, no meu atual emprego, posso me tornar o Noel. Ou o Chico, que é pegador. Havia outro mantra que cansei de ouvir: "Viu, não estudei, tô carregando caixas" ou "Minha mãe disse: estuda meu filho.Não dei ouvidos. Olha eu aí". Quanto a mim, havia estudado uns quatro anos e também estava carregando caixas. Você tem que completar as matérias. Isso não se faz nem na boca de fumo, nem no bar. Por outro lado, a maior parte dos colegas que conheci na faculdade e que formaram-se em História, Filosofia e Sociologia tornaram-se professores desmotivados de alunos com coisas realmente interessantes na cabeça, como ácido, maconha, cocaína, bebidas, carros e sexo. Outros conseguiram ser livreiros e alguns alcançaram até o direito de trabalhar no turno diurno. Eles também carregam caixas, de livros, mas às vezes apenas livros individualmente. Meus parabéns, por toda essa garra e determinação, meus parabéns por essa conquista. Aposto que não foi fácil encher a cara de maconha e se formar. Não foi pra mim.

Voltava todas as noites pro apartamento que dividíamos, com mais um casal e uma amiga. Sinto falta da amiga. Na verdade, senti falta dela assim que fui expulso do apartamento, levando apenas livros, roupas e talvez HPV. Ela lamentou minha partida - estava presente quando eu e minha atual ex ficamos a primeira vez. Ela era a baranga maravilha que mencionei acima. Devia ter casado com ela. No entanto, com toda a Divina Graça do Seu requebrado, encontrei um amigo que havia expulsado a namorada dele de casa. E era o mesmo amigo do bar onde havia conhecido minha (agora ex) namorada. Nessa outra encruzilhada da vida, entre o suicídio e a casa da minha mãe, imediatamente vislumbrei Sua Luz Dourada em minha vida, na forma de cerveja e uma mostarda que eu tento me lembrar o nome até hoje. Tudo grátis. Foi uma época de ouro. Ouro do meu amigo, que além de rico é generoso. O que fez disso tudo uma coisa mais especial foi que pude prosseguir me afogando em minhas mágoas sem gastar dinheiro. Mínimo investimento pra máximo retorno. Isso é que é sorte. A expulsão não precisou se transformar numa lição de moral sobre ser mais atencioso, ter ambição, subir na vida ou parar de beber - nada que exigisse esforço. Tudo o que ela fez foi me dar um sofá, uma janela, comida, cerveja e nada pra fazer, nem niguém pra fuder comigo, em nenhum sentido. Continuava pagando pelos (meus) cigarros, mas estava de volta ao auge. Foi um meio de prosseguir fazendo o que gostava. E o importante é ser feliz. Obrigado.


P.S. Ainda carrego comigo o medo de ser portador do HPV - por favor mande um sinal.

P.P.S Não, deixe como está.

Oração do Homem Branco

Meu São Judas Tadeu
que o crioulo a correr
não roube e possa comer
tanto quanto um judeu;
e que o índio ali deitado
não seja Galdino ou Paiakan
dê-lhe a força pro trabalho
como ao pasteleiro Jackie Chan.

Mas acabai com o contrabando.

Discar 190 e rezar até a polícia chegar.

A Oração do Homem Branco foi escrita por um mestiço bem intencionado.
A vida é difícil ( para todos), mas Teresópolis é foda. Fácil de esbarrar nas pessoas por ai, numa cidade toda de encruzilhada do tamanho de um saco no frio. Facinho do passado escarrar em você, quando passa em direção ao túnel escuro e apertado do futuro. Tudo isso me lembra a Bia, um cuzinho que nunca vi.

Ela é drogada. Ela é vagabunda. Ela é macumbeira. Talvez ela tenha uma doença venérea ("doença venérea" é tão ano 60 que as minhas costas doem só de escrever - e nem estive lá. Deve ser atavismo).

Então, me lembrei da Bia porque meu amigo tinha um primo que colava com uma vagabunda que o largara em sua atribulada adolescência, e aí ela apareceu com a Bia muitos anos depois, numa encruzilhada de Teresópolis, onde tinha um boteco em que me encontrava bebendo. Eu tava com um amigo e nós estávamos de saco cheio, de cara cheia, sem droga e sem mulher. O dinheiro no fim. É sempre quarta-feira quando se está duro. Nessa a Bia chegou. Beleza - parecia que eu tinha achado pó no chão. Até me esqueci que não existe mulher grátis. Nem cocaína. Não lembro como começou a conversa. Tinha a ver com tê-la chamado de "Maria Padilha" em alguma festa perdida nas névoas etílicas. Macumbeira adora essas coisas. Até achei que ia ela ia me dar drogas ou a bunda. Talvez eu também pudesse lhe passar alguma coisa. Não fomos tão longe. Pelo menos ela pagou umas canas. Eu biritava, jogava conversa fora, dando o máximo do que restava de mim pra parecer menos bêbado. Mas eu tava fudido. Queria gritar "pó ou a bunda", de canudo numa mão, e pau na outra, just in case.Bia também estava quase dura, - e ela não tem pau, então você entendeu - é uma metáfora - e também sem drogas. Mas, sendo mulher e vagabunda, conseguiu dar o balão no doce de um traficante gordo mais otário desses daí, de cidade de interior. Achei que ele fosse ficar bolado, mas ela deve ter dito que voltava depois, porque ele não correu atrás. Traficante que faz fiado. Hehehe. Igual puta com coração. Altas horas da madrugada, doidão daquele jeito, nem ia conseguir comer ninguém. E as meninas fingindo que estavam doidonas, e eu pensava "putz, ácido de merda", porque dava pra sacar que ninguém tava doidona de doce, só fazendo aquele tipo retardado que neguinho curte nesses filmes de colégio americano. Já tava boladão, e aí veio ela: "Sempre achei que você parecia o Brédi Piti"."Toma outra, Brédi". Ah cara, nem minha mãe diz isso pra mim. Talvez ela oferecesse a bebida. Mas sabe, minhas cabeças queriam acreditar. Quase me lembrei de ter ouvido isso antes. "Brédi", hehehe. Então falou.Foi quando ela me levou pro banheiro. E deu-se sacanagem, por um bom tempo. As pessoas de fora impacientes, um cara com aquela cara de japonês que você sabe que é bom de porrada, ele não tinha óculos nem nada, e eu já tendo quebrado uma ou duas tulipas, derrubado uma mesa e tal . Merecer porrada deixa os outros mais fortes. A gente continuava se pegando e rindo alto e a coisa foi esquentando, e Terê é frio, não queria sair dali durante a madrugada e ir pra casa , eu moro longe pra caralho. "Vocês não tão em casa não"."Abre essa porra" - disse alguém, provavelmente de charuto já no beiço. Talvez o urubu bicasse doído. Quem sabe o que aflige os homens?
Parecia o japonês. Era o japonês. Intuição. Cagaço. Eu não estava muito sortudo aquela noite. As pessoas davam murros na porta. A Bia dava murros na porta de volta. Não sou nenhum cagão, mas também nenhum Rambo ( nem o Brédi - ele é um vampiro gay, quem é o Rambo é o Estalone que é musculoso e tem uma faca). Já imaginava como sair fora. As vozes começaram a aumentar aos poucos, mas o exercício e a tensão levaram um pouco da minha bebedeira embora, e comecei a ficar bolado, neguinho lá fora já falando de violência, e eu desarmado - um homem assim fica muito pacífico e avesso a confusão. Resolvi sair dali; já tinha rolado uma covardia mais ao meu estilo, cinco contra um e nenhum dos cinco meus. Mas lá fora, por alguma razão, fui eu quem começou a pagar a bebida. Aí era demais pra mim. Eu estava fora de controle. Eu precisava ir pra casa. Dei um perdido na vagaba, ao raiar do sol - Deus é poético e eu tenho meu requebrado. Enquanto Ele mijava os dourados do horizonte, minha cabeça pesava com o peso da consciência - não, era ressaca - tenho discernimento. Passei a semana seguinte evitando encruzilhadas. E butecos. Nada disso é fácil em Teresópolis. Nunca mais vi a Bia. Talvez ela esteja internada de novo. Talvez ela tenha morrido ou acertado no milhar. Não é que eu tenha saudade, mas Teresopolis é frio e as vezes eu estou por lá e a madrugada demora a passar. A vida não é fácil (pra ninguém).